O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão | Estudos Espíritas

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ESDE — Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita — Programa Complementar

Módulo VII — Fenômenos de Emancipação da Alma

Roteiro 1


Sono e sonhos


Objetivo Geral: Apresentar esclarecimentos a respeito dos fenômenos de emancipação da alma.

Objetivos Específicos: Estabelecer a diferença entre sono e sonho. — Justificar a importância do sono, do ponto de vista espírita.



CONTEÚDO BÁSICO


  • Durante o sono, a alma repousa como o corpo? Não, o Espírito jamais está inativo. Durante o sono, afrouxam-se os laços que o prendem ao corpo e, não precisando este então da sua presença, ele se lança pelo espaço e entra em relação mais direta com os outros Espíritos. Allan Kardec: O Livro dos Espíritos, questão 401.

  • Como podemos julgar da liberdade do Espírito durante o sono? Pelos sonhos. Quando o corpo repousa, […] tem o Espírito mais faculdades do que no estado de vigília. Lembra-se do passado e algumas vezes prevê o futuro. Adquire maior potencialidade e pode pôr-se em comunicação com os demais Espíritos, quer deste mundo, quer do outro. […] O sono liberta a alma parcialmente do corpo. Quando dorme, o homem se acha por algum tempo no estado em que fica permanentemente depois que morre. […] O sonho é a lembrança do que o Espírito viu durante o sono. Notai, porém, que nem sempre sonhais. Que quer isso dizer? Que nem sempre vos lembrais do que vistes, ou de tudo o que haveis visto, enquanto dormíeis. E que não tendes então a alma no pleno desenvolvimento de suas faculdades. Muitas vezes, apenas vos fica a lembrança da perturbação que o vosso Espírito experimenta à sua partida ou no seu regresso, acrescida da que resulta do que fizestes ou do que vos preocupa quando despertos. Allan Kardec: O Livro dos Espíritos, questão 402.

  • Graças ao sono, os Espíritos encarnados estão sempre em relação com o mundo dos Espíritos. Por isso é que os Espíritos superiores assentem, sem grande repugnância, em encarnar entre vós. Quis Deus que, tendo de estar em contacto com o vício, pudessem eles ir retemperar se na fonte do bem, a fim de igualmente não falirem, quando se propõem a instruir os outros. O sono é a porta que Deus lhes abriu, para que possam ir ter com seus amigos do céu; é o recreio depois do trabalho, enquanto esperam a grande libertação, a libertação final, que os restituirá ao meio que lhes é próprio. Allan Kardec: O Livro dos Espíritos, questão 402.

  • O sono foi dado ao homem para reparação das forças orgânicas e também para a das forças morais. Enquanto o corpo recupera os elementos que perdeu por efeito da atividade da vigília, o Espírito vai retemperar se entre os outros Espíritos. Haure, no que vê, no que ouve e nos conselhos que lhe dão, ideias que, ao despertar, lhe surgem em estado de intuição. É a volta temporária do exilado à sua verdadeira pátria. É o prisioneiro restituído por momentos à liberdade. Allan Kardec: O Evangelho segundo o Espiritismo. Capítulo XXVIII. Item 38.




SUGESTÕES DIDÁTICAS


Introdução:

  • Iniciar o estudo apresentando um cartaz contendo a seguinte questão: Qual a importância do sono para a nossa existência?

  • Solicitar que os participantes, em duplas, discutam o assunto.

  • Ouvir as respostas das duplas, sem comentá-las.


Desenvolvimento:

  • Em seguida, formar quatro grupos para a realização das seguintes tarefas, em duas etapas:

    1ª. Etapa:

    1) Ler os itens 1 e 2 dos Subsídios;

    2) Responder às seguintes perguntas:

    a) Que diferença existe entre sono e sonho?

    b) Qual a importância do sono, do ponto de vista espírita?

    3) Escrever as respostas em folha de papel-pardo, afixando-a em local indicado pelo monitor.

    2ª. Etapa:

    Grupo I

    1) Ler o item 3.1 dos Subsídios;

    2) Trocar ideias sobre o conteúdo lido, inclusive compartilhando experiências semelhantes ao caso relatado, eventualmente ocorridas com os integrantes do grupo.

    Grupo II

    1) Ler o item 3.2 dos Subsídios;

    2) Trocar ideias sobre o conteúdo lido, inclusive compartilhando experiências semelhantes ao caso relatado, eventualmente ocorridas com os integrantes do grupo.

    Grupo III

    1) Ler o item 3.3 dos Subsídios;

    2) Trocar ideias sobre o conteúdo lido, inclusive compartilhando experiências semelhantes ao caso relatado, eventualmente ocorridas com os integrantes do grupo.

    Grupo IV

    1) Ler o item 3.4 dos Subsídios;

    2) Trocar ideias sobre o conteúdo lido, inclusive compartilhando experiências semelhantes ao caso relatado, eventualmente ocorridas com os integrantes do grupo.

  • Findo o trabalho dos grupos, fazer uma exposição do assunto, a partir dos cartazes elaborados pelos participantes, esclarecendo pontos e dirimindo dúvidas.


Conclusão:

  • Encerrar o estudo destacando a importância da prece à hora de dormir, a fim de que bem aproveitemos os momentos de liberdade que nos são concedidos pelo sono físico. Sentiremos, assim, ao despertar, energias novas, tornando-nos mais fortes contra o mal, mais corajosos diante das lutas da vida.


Avaliação:

  • O estudo será considerado satisfatório, se os participantes realizarem adequadamente as tarefas propostas e ouvirem, com interesse, a exposição do assunto.


Técnica(s):

  • Exposição; estudo em duplas; trabalho em pequenos grupos.


Recurso(s):

  • Subsídios do roteiro; cartaz; folhas de papel-pardo; caneta hidrográfica; fita adesiva.



 

SUBSÍDIOS


1. Sono e sonho: diferença entre um e outro

O Espírito jamais está inativo. Durante o sono, afrouxam-se os laços que o prende ao corpo e, não precisando este então da sua presença, ele se lança pelo espaço e entra em relação mais direta com os outros Espíritos. (2)

Em resposta à questão 402 de O Livro dos Espíritos, dizem os Orientadores Espirituais que se pode julgar a liberdade do Espírito durante o sono pelos […] sonhos. Quando o corpo repousa, […] tem o Espírito mais faculdades do que no estado de vigília. Lembra-se do passado e algumas vezes prevê o futuro. Adquire maior potencialidade e pode pôr se em comunicação com os demais Espíritos, quer deste mundo, quer do outro. […] O sono liberta a alma parcialmente do corpo. Quando dorme, o homem se acha por algum tempo no estado em que fica permanentemente depois que morre. Tiveram sonos inteligentes os Espíritos que, desencarnando, logo se desligam da matéria. Esses Espíritos, quando dormem, vão para junto dos seres que lhes são superiores. Com estes viajam, conversam e se instruem. Trabalham mesmo em obras que se lhes deparam concluídas, quando volvem, morrendo na Terra, ao mundo espiritual. […] Isto, pelo que concerne aos Espíritos elevados. Pelo que respeita ao grande número de homens que, morrendo, têm que passar longas horas na perturbação, […] esses vão, enquanto dormem, ou a mundos inferiores à Terra, onde os chamam velhas afeições, ou em busca de gozos quiçá mais baixos do que os em que aqui tanto se deleitam. (3)

Mais adiante, na mesma questão, assinalam: O sonho é a lembrança do que o Espírito viu durante o sono. Notai, porém, que nem sempre sonhais. Que quer isso dizer? Que nem sempre vos lembrais do que vistes, ou de tudo o que haveis visto, enquanto dormíeis. É que não tendes a alma em pleno desenvolvimento de suas faculdades. Muitas vezes, apenas vos fica a lembrança da perturbação que o vosso Espírito experimenta à sua partida ou no seu regresso, acrescida da que resulta do que fizestes ou do que vos preocupa quando despertos. A não ser assim, como explicaríeis os sonhos absurdos, que tanto os sábios, quanto as mais humildes e simples criaturas têm? Acontece também que os maus Espíritos se aproveitam dos sonhos para atormentar as almas fracas e pusilânimes. Em suma, dentro em pouco vereis vulgarizar se outra espécie de sonhos. Conquanto tão antiga como a de que vimos falando, vós a desconheceis. Refiro-me aos sonhos de Joana, ao de Jacob, aos dos profetas judeus e aos de alguns adivinhos indianos. São recordações guardadas por almas que se desprendem quase inteiramente do corpo […]. (4)

Assim, os […] sonhos são efeito da emancipação da alma, que mais independente se torna pela suspensão da vida ativa e de relação. Daí uma espécie de clarividência indefinida que se alonga até aos mais afastados lugares e até mesmo a outros mundos. Daí também a lembrança que traz à memória acontecimentos da precedente existência ou das existências anteriores. As singulares imagens do que se passa ou se passou em mundos desconhecidos, entremeados de coisas do mundo atual, é que formam esses conjuntos estranhos e confusos, que nenhum sentido ou ligação parecem ter. A incoerência dos sonhos ainda se explica pelas lacunas que apresenta a recordação incompleta que conservamos do que nos apareceu quando sonhávamos. É como se a uma narração se truncassem frases ou trechos ao acaso. Reunidos depois, os fragmentos restantes nenhuma significação racional teriam. (5)

Kardec pergunta aos Espíritos Superiores por que não nos lembramos sempre dos sonhos. Eles respondem o seguinte: Em o que chamais sono, só há o repouso do corpo, visto que o Espírito está constantemente em atividade. Recobra, durante o sono, um pouco da sua liberdade e se corresponde com os que lhe são caros, quer neste mundo, quer em outros. Mas, como é pesada e grosseira a matéria que o compõe, o corpo dificilmente conserva as impressões que o Espírito recebeu, porque a este não chegaram por intermédio dos órgãos corporais. (6)

Afim de que haja a emancipação do Espírito, porém, não há necessidade de o sono ser completo. Basta […] que os sentidos entrem em torpor para que o Espírito recobre a sua liberdade. Para se emancipar, ele se aproveita de todos os instantes de trégua que o corpo lhe concede. Desde que haja prostração das forças vitais, o Espírito se desprende, tornando-se tanto mais livre, quanto mais fraco for o corpo. (7) Dessa forma, estando […] entorpecido o corpo, o Espírito trata de desprender se. Transporta-se e vê. Se já fosse completo o sono, haveria sonho. (8)


2. A importância do sono, do ponto de vista espírita

Dizem os Instrutores da Codificação que, graças ao sono, […] os Espíritos encarnados estão sempre em relação com o mundo dos Espíritos. Por isso é que os Espíritos superiores assentem, sem grande repugnância, em encarnar entre vós. Quis Deus que, tendo de estar em contacto com o vício, pudessem eles ir retemperar se na fonte do bem, a fim de igualmente não falirem, quando se propõem a instruir os outros. O sono é a porta que Deus lhes abriu, para que possam ir ter com seus amigos do céu; é o recreio depois do trabalho, enquanto esperam a grande libertação, a libertação final, que os restituirá ao meio que lhes é próprio. (4)

Sendo assim, o […] sono foi dado ao homem para reparação das forças orgânicas e também para a das forças morais. Enquanto o corpo recupera os elementos que perdeu por efeito da atividade da vigília, o Espírito vai retemperar se entre os outros Espíritos. Haure, no que vê, no que ouve e nos conselhos que lhe dão, ideias que, ao despertar, lhe surgem em estado de intuição. É a volta temporária do exilado à sua verdadeira pátria. É o prisioneiro restituído por momentos à liberdade. (1)

No decorrer do sono, podemos entrar em contato com outros Espíritos encarnados, inclusive com pessoas que desconhecemos no estado de vigília. Podemos ter, sem o suspeitarmos, amigos em outro país. (9) Dizem os Espíritos superiores: É tão habitual o fato de irdes encontrar vos, durante o sono, com amigos e parentes, com os que conheceis e que vos podem ser úteis, que quase todas as noites fazeis essas visitas. (9) Ao despertarmos, guardamos intuição desse fato, do qual se originam determinadas ideias, que nos surgem espontaneamente no estado de vigília. (10)


3. Experiências significativas durante o sono

A literatura espírita está repleta de exemplos de experiências significativas durante o sono. Alinhamos, a seguir, alguns exemplos dessas experiências.


3.1. Esclarecimentos gerais a Espíritos encarnados

No livro Missionários da Luz, no capítulo intitulado No plano dos sonhos, André Luiz nos fala dos esclarecimentos prestados a Espíritos encarnados durante o período do sono físico natural. Diz o referido autor: Após alguns minutos de conversação encantadora, o Irmão Francisco acercou-se do orientador, indagando sobre os objetivos da reunião da noite.

— Sim — esclareceu Alexandre, afável — , teremos algum trabalho de esclarecimento geral a amigos nossos, relativamente a problemas de mediunidade e psiquismo, sem minúcias particulares.

— Se nos permite — tornou o interlocutor — , estimaria trazer alguns companheiros que colaboram frequentemente conosco. Seria para nós grande satisfação vê-los aproveitando os minutos de sono físico.

— Sem dúvida. Destina-se o serviço de hoje à preparação de cooperadores nossos, ainda encarnados na Crosta. Estaremos à sua disposição e receberemos seus auxiliares com alegria.

Francisco agradeceu sensibilizado e perguntou:

— Poderemos providenciar?

— Imediatamente — explicou o instrutor, sem hesitação — conduza os amigos ao sítio de seu conhecimento.

Afastou-se o grupo de “socorristas”, deixando-me verdadeiro mundo de pensamentos novos.

Segundo informações anteriores, Alexandre dirigiria, naquela noite, pequena assembleia de estudiosos e, assim que nos vimos a sós, explicou-me, solícito:

— Nosso núcleo de estudantes terrestres já possui certa expressão numérica; no entanto, faltam-lhe determinadas qualidades essenciais para funcionar com pleno proveito. Em vista disso, é imprescindível dotar os companheiros de conhecimentos mais construtivos. […] — Atendendo às injunções dessa ordem, estabeleci um curso de esclarecimento metódico para melhorar a situação. […] — Contamos, em nosso centro de estudos, com número superior a trezentos associados; no entanto, apenas trinta e dois conseguem romper as teias inferiores das mais baixas sensações fisiológicas, para assimilarem nossas lições. E noites se verificam em que mesmo alguns desses quebram os compromissos assumidos, atendendo a seduções comuns, reduzindo-se ainda mais a frequência geral. (13)

Em compensação, de quando em vez há o comparecimento fortuito de outros companheiros, como ocorre nesta noite, em face da lembrança do Irmão Francisco, que nos trará alguns amigos.

— E os irmãos que comparecem — indaguei, curioso — conservam a recordação integral dos serviços partilhados, de estudos levados a efeito e observações ouvidas?

Alexandre pensou um momento e considerou:

— Mais tarde, a experiência mostrará a você como é reduzida a capacidade sensorial. O homem eterno guarda a lembrança completa e conservará consigo todos os ensinamentos, intensificando-os e valorizando-os, de acordo com o estado evolutivo que lhe é próprio. O homem físico, entretanto, escravo de limitações necessárias, não pode ir tão longe. O cérebro de carne, pelas injunções da luta a que o Espírito foi chamado a viver, é aparelho de potencial reduzido, dependendo muito da iluminação de seu detentor, no que se refere à fixação de determinadas bênçãos divinas. Desse modo, André, o arquivo de semelhantes reminiscências, no livro temporário das células cerebrais, é muito diferente nos discípulos entre si, variando de alma para alma. Entretanto, cabe-me acrescentar que, na memória de todos os irmãos de boa vontade, permanecerá, de qualquer modo, o benefício, ainda mesmo que eles, no período de vigília, não consigam positivar a origem. As aulas, no teor daquela a que você assistirá nesta noite, são mensageiras de inexprimíveis utilidades práticas. Em despertando, na Crosta, depois delas, os aprendizes experimentam alívio, repouso e esperança, a par da aquisição de novos valores educativos. É certo que não podem reviver os pormenores, mas guardarão a essência, sentindo-se revigorados, de inexplicável maneira para eles, não só a retomar a luta diária no corpo físico, mas também a beneficiar o próximo e combater, com êxito, as próprias imperfeições. Seus pensamentos tornam-se mais claros, os sentimentos mais elevados e as preces mais respeitosas e produtivas, enriquecendo-se-lhes as observações e trabalhos de cada dia. (14)


3.2. Atendimento individualizado

Em outra obra, Nos Domínios da Mediunidade, o mesmo autor relata um episódio de sono provocado pelos Espíritos benfeitores, com o objetivo de atendimento individualizado. Eis a descrição do fato: Cuidadosamente, começaram ambos a aplicar-lhe passes sobre a cabeça, concentrando energia magnética ao longo das células corticais. Anésia viu-se presa de branda hipnose, que ela própria atribuía ao cansaço e não relutou. Em breves instantes, deixava o corpo denso na prostração do sono, vindo ao nosso encontro em desdobramento quase natural. Não parecia, contudo, tão consciente em nosso plano quanto seria de desejar. Centralizada no afeto ao marido, Jovino constituía-lhe obcecante preocupação. Reconheceu Teonília e Áulus por benfeitores e lançou-nos significativo olhar de simpatia, no entanto, mostrava-se atordoada, aflita… Queria ver o esposo, ouvir o esposo… O Assistente [Áulus] deliberou satisfazê-la. Amparada pelos braços da admirável amiga [Teonília], tomou a direção que lhe pareceu acertada, como quem possuía, de antemão, todos os dados necessários à localização do marido. Áulus conosco explicou que as almas, quando associadas entre si, vivem ligadas umas às outras pela imanação magnética, superando obstáculos e distâncias. Em vasto salão de um clube noturno, surpreendemos Jovino e a mulher que se fizera nossa conhecida […], integrando um grupo alegre, em atitudes de profunda intimidade afetiva. Rodeando o conjunto, diversas entidades, estranhas para nós, formavam vicioso círculo de vampiros que não nos registraram a presença. […] Ao defrontar o companheiro na posição em que se achava, Anésia desferiu doloroso grito e caiu em pranto. Seguida por nós, recuou ferida de aflição e assombro e tão logo nos vimos na via pública, bafejados pelo ar leve da noite, o Assistente abraçou-a, paternal. Notando-a mais senhora de si, embora o sofrimento lhe transfigurasse o rosto, falou-lhe com extremado carinho: — Minha irmã, recomponha-se. Você orou, pedindo assistência espiritual, e aqui estamos, trazendo-lhe solidariedade. (15) Reanime-se! Não perca a esperança!… — Esperança? — clamou a pobre criatura em lágrimas. — Fui traída, miseravelmente traída… E o entendimento, entre os dois, prosseguia comovente e expressivo. — Traída por quem? — Por meu esposo, que falhou aos compromissos do casamento. — Mas você admite, porventura, que o casamento seja uma simples excursão no jardim da carne? Supôs que o matrimônio terrestre fosse apenas a música da ilusão a eternizar se no tempo? Minha amiga, o lar é uma escola em que as almas se reaproximam para o serviço da sua própria regeneração, com vistas ao aprimoramento que nos cabe apresentar de futuro. Você ignora que no educandário há professores e alunos? Desconhece que os melhores devem ajudar aos menos bons? […] — Mas Jovino… Áulus, porém, cortou-lhe a frase, acrescentando: — Esquece-se de que seu esposo precisa muito mais agora de seu entendimento e carinho? Nem sempre a mulher poderá ver no companheiro o homem amado com ternura, mas sim um filho espiritual necessitado de compreensão e sacrifício para soerguer se, como também nem sempre o homem conseguirá contemplar na esposa a flor de seus primeiros sonhos, mas sim uma filha do coração a requisitar-lhe tolerância e bondade, a fim de que se transfira da sombra para a luz. […] — Sim, sim… Reconheço… Entretanto, não me deixe sozinha… […] — Mas como aceitá-la? Percebo-lhe a influência maligna… […] Que fazer de semelhante criatura? — Compadeçamo-nos dela! Terrível ser-lhe-á o despertamento. (16) […] Anésia, assemelhando-se a uma criança resignada, pousou no benfeitor os olhos límpidos, como a prometer-lhe obediência, e Áulus, afagando-a, recomendou: — Volte ao lar e use a humildade e o perdão, o trabalho e a prece, a bondade e o silêncio, na defesa de sua segurança. […] Vimo-la despertar no corpo carnal, de alma renovada, quase feliz… Enxugou as lágrimas que lhe banhavam o rosto e tentou ansiosamente recordar, ponto a ponto, a entrevista que tivera conosco. Em verdade, não conseguiu alinhar senão fragmentárias reminiscências, mas reconheceu-se reconfortada, sem revolta e sem amargura, como se mãos intangíveis lhe houvessem lavado a mente, conferindo-lhe uma compreensão mais clara da vida. (17)


3.3. Recordação de existência passada

Emmanuel, no livro Há Dois Mil Anos, refere um outro tipo de experiência através do sono: a recordação de existência passada. Trata-se do sonho de Públio Lentulus, registrado no início da mencionada obra. Eis pequena parte do relato de Públio a seu amigo Flamínio: Recolhi-me cedo e, quando parecia divisar junto de mim a imagem de Têmis [deusa romana da Justiça], que guardamos no altar doméstico, considerando as singulares obrigações de quem exerce as funções da justiça, senti que uma força extraordinária me selava as pálpebras cansadas e doloridas. No entanto, via outros lugares, reconhecendo paisagens familiares ao meu espírito, das quais me havia esquecido inteiramente. Realidade ou sonho, não o sei dizer, mas vi-me revestido das insígnias de cônsul, ao tempo da República. Parecia-me haver retrocedido à época de Lúcio Sergius Catilina, pois o via a meu lado, bem como Cícero, que se me afiguravam duas personificações, do mal e do bem. Sentia-me ligado ao primeiro por laços fortes e indestrutíveis, como se estivesse vivendo a época tenebrosa da sua conspiração contra o Senado, e participando, com ele, da trama ignominiosa que visava à mais íntima organização da República. Prestigiava-lhe as intenções criminosas, aderindo a todos os seus projetos com a minha autoridade administrativa, assumindo a direção de reuniões secretas, onde decretei assassínios nefandos…. […] Todavia, o que mais me humilhava nessas visões do passado culposo, como se a minha personalidade atual se envergonhasse de semelhantes reminiscências, é que me prevalecia da autoridade e do poder para, aproveitando a situação, exercer as mais acerbas vinganças contra inimigos pessoais, contra quem expedia ordens de prisão, sob as mais terríveis acusações. (12)


3. 4. Um caso de premonição

Os exemplos de experiências relevantes através do sono multiplicam-se, tanto nas obras mediúnicas como nas voltadas para as pesquisas científicas. Dentre essas últimas, pode ser colhido, na obra A Morte e o Seu Mistério, este interessante caso, relatado a Camille Flammarion pelo conceituado pesquisador, Sr. Frederico Passy: Não a encontrei [a presente narrativa], […] na sua obra O Desconhecido e tenho a certeza de que o interessará, pois procede dum escritor escrupuloso, dum homem de integridade incontestável, o quaker Etienne de Grelet. Dou ao senhor a narrativa, tal qual como a transcrevi da relação da sua viagem à Rússia. Durante a sua permanência em S. Petersburgo, a Condessa Toutschkoff contou ao quaker viajante o seguinte: Uns três meses antes da entrada dos franceses na Rússia [invasão de Napoleão Bonaparte], o general, seu marido, estava com ela no seu domínio de Toula. Achando-se num hotel, em cidade desconhecida, ela sonhou que seu pai entrara, levando o filho único pela mão e dizendo-lhe estritamente: — A tua felicidade acabou. Teu marido caiu. Caiu em Borodino. Acordou muito perturbada, mas, vendo seu marido junto dela, compreendeu que sonhava e adormeceu novamente. O mesmo sonho se repetiu, e ela sentiu tanta tristeza que levou muito tempo a recuperar a serenidade. O sonho voltou terceira vez. Experimentou tão grande angústia que despertou seu marido, perguntando-lhe: — Onde é Borodino? Ele não o sabia. Durante a manhã, ambos, com seu pai, se puseram a procurar este nome no mapa, sem encontrá-lo. Borodino era então lugar muito obscuro; mas tornou-se depois afamado, pela batalha sangrenta que se feriu nas suas cercanias. Entretanto, a impressão causada, na condessa, era profunda, e grande sua inquietação… O teatro da guerra era longe então, mas rapidamente se aproximou. Antes da chegada dos exércitos franceses a Moscou, o General Toutschkoff foi posto à testa do exército russo de reserva. Certa manhã, o pai da condessa, levando seu filho pela mão, entrou no quarto do hotel em que ela se hospedara. Estava triste, como a condessa o tinha visto em seu sonho, e dizia-lhe: — Ele caiu, ele caiu em Borodino. A condessa viu-se, como no sonho que tivera, no quarto, cercada dos mesmos objetos. Seu marido foi, efetivamente, uma das numerosas vítimas da renhida batalha que se pelejou perto do rio de Borodino, que deu o seu nome a uma aldeia. (11)

Os casos assinalados e inúmeros outros ocorridos ao longo da história da Humanidade demonstram claramente a importância deste período de aparente repouso, e que mais não é do que bendita oportunidade de relacionamento com o mundo dos Espíritos. Compete a nós bem aproveitá-la para o nosso crescimento espiritual, uma vez que, conforme assinalam os Espíritos Superiores: O sono […] influi mais do que supondes na vossa vida. (4) Eleve, pois, aquele que se ache compenetrado desta verdade, o seu pensamento a Deus, quando sinta aproximar se o sono, e peça o conselho dos bons Espíritos e de todos cuja memória lhe seja cara, a fim de que venham juntar-se-lhe, nos curtos instantes de liberdade que lhe são concedidos, e, ao despertar, sentir-se-á mais forte contra o mal, mais corajoso diante da adversidade. (1)



Referências Bibliográficas:

1. KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 124. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004. Capítulo XXVIII, Item 38, p. 409.

2. Idem - O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 86. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005, questão 401, p. 221.

3. Id. - Questão 402, p. 221-222.

4. Idem, ibidem - p. 223.

5. Idem, ibidem - p. 224.

6. Id. - Questão 403, p. 224.

7. Id. - Questão 407, p. 226.

8. Id. - Questão 409, p. 226

9. Id. - Questão 414, p. 227.

10. Id. - Questão 415, p. 228.

11. FLAMMARION, Camille. 6. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004. A Morte e o seu Mistério. vol. I, Capítulo IX, p. 241-242.

12. XAVIER, Francisco Cândido. Há Dois Mil Anos. Pelo Espírito Emmanuel. 45. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005, Primeira Parte, Capítulo I, (Dois Amigos), p. 20-21.

13. Idem - Missionários da Luz. Pelo Espírito André Luiz. 39. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004. Capítulo 8, (No Plano dos Sonhos), p. 101-102.

14. Idem, ibidem - p. 103-104.

15. Idem - Nos Domínios da Mediunidade. Pelo Espírito André Luiz. 31. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004. Capítulo 20, (Mediunidade e Oração), p. 225-226.

16. Idem, ibidem - p. 227-229.

17. Idem, ibidem - p. 230.


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