O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Entre a Terra e o Céu — André Luiz


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Conversação edificante

(Sumário)

1. Enquanto regressávamos ao nosso círculo de trabalho e de estudo, para articular novas providências de auxílio, em favor dos protagonistas da história que a vida estava escrevendo, concluí que não me cabia perder a oportunidade de mais amplo entendimento com o nosso orientador, com alusão aos esclarecimentos que nos fornecera, acerca do perispírito.

2 Assim como o homem comum mal conhece o veículo em que se movimenta, ignorando a maior parte dos processos vitais de que se beneficia e usando o corpo de carne à maneira de um inquilino estranho à casa em que reside, também nós, os desencarnados, somos compelidos a meticulosas meditações para analisar a vestimenta de que nos servimos, de modo a conhecer-lhe a intimidade.

3 Efetivamente, em novas condições na vida espiritual, passamos a apreciar, com mais segurança, o corpo abandonado à Terra, penetrando os segredos de sua formação e desenvolvimento, sustentação e desintegração, mas somos desafiados pelos enigmas do novo instrumento que passamos a utilizar. 4 Lidamos, na Vida Maior, com o carro sutil da mente, pelo menos na Esfera em que nos situamos, acentuando, pouco a pouco, os nossos conhecimentos, quanto às peculiaridades que lhe dizem respeito.

5 Reparei que Hilário, pela expressão dos olhos, demonstrava não menor anseio de saber. E, encorajado pela atitude do companheiro, desfechei a primeira questão, considerando:

— Inegavelmente, será difícil alcançar o grande equilíbrio que nos outorgará o trânsito definitivo para as eminências do Espírito Puro.

6 — Ah! Sim. — Concordou o Ministro, com grave entono, — para que tivéssemos na Crosta Planetária um vaso tão aprimorado e tão belo, quanto o corpo humano, a Sabedoria Divina despendeu milênios de séculos, usando os multiformes recursos da Natureza, no campo imensurável das formas… 7 Para que venhamos a possuir o sublime instrumento da mente em Planos mais elevados, não podemos esquecer que o Supremo Pai se vale do tempo infinito para aperfeiçoar e sublimar a beleza e a precisão do corpo espiritual que nos conferirá os valores imprescindíveis à nossa adaptação à Vida Superior.

8 — Compete-nos, então, — observou Hilário, atencioso, — atribuir importante papel às enfermidades na Esfera humana. Quase todas estarão no mundo, desempenhando expressivo papel na regeneração das almas.

— Exatamente.

9 — Cada “centro de força”, — ponderei, — exigirá absoluta harmonia, perante as Leis Divinas que nos regem, a fim de que possamos ascender no rumo do Perfeito Equilíbrio…

— Sim, — confirmou Clarêncio, — nossos deslizes de ordem moral estabelecem a condensação de fluidos inferiores de natureza gravitante, no campo eletromagnético de nossa organização, compelindo-nos a natural cativeiro em derredor das vidas começantes às quais nos imantamos.

10 Hilário, conduzindo mais longe as próprias divagações, perguntou:

— Imaginemos, contudo, um homem puramente selvagem, a situar-se em plena ignorância dos Desígnios Superiores, que se confia a delitos indiscriminados… Terá nos tecidos sutis da alma as lesões cabíveis a um europeu supercivilizado, que se entrega à indústria do crime?

11 Clarêncio sorriu, compreensivo, e acentuou:

— Sigamos devagar. Comentávamos, ainda há pouco, o problema da evolução. Assim como o aperfeiçoado veículo do homem nasceu das formas primárias da Natureza, o corpo espiritual foi iniciado também nos princípios rudimentares da inteligência. 12 É necessário não confundir a semente com a árvore ou a criança com o adulto, embora surjam na mesma paisagem de vida. 13 O instrumento perispirítico do selvagem deve ser classificado como protoforma humana, extremamente condensado pela sua integração com a matéria mais densa. Está para o organismo aprimorado dos Espíritos algo enobrecidos, como um macaco antropomorfo ( † ) está para o homem bem-posto das cidades modernas. 14 Em criaturas dessa espécie, a vida moral está começando a aparecer e o perispírito nelas ainda se encontra enormemente pastoso. Por esse motivo, permanecerão muito tempo na escola da experiência, como o bloco de pedra rude sob marteladas, antes de oferecer de si mesmo a obra-prima… 15 Despenderão séculos e séculos para se rarefazerem, usando múltiplas formas, de modo a conquistarem as qualidades superiores que, em lhes sutilizando a organização, lhes conferirão novas possibilidades de crescimento consciencial. 16 O instinto e a inteligência pouco a pouco se transformam em conhecimento e responsabilidade e semelhante renovação outorga ao ser mais avançados equipamentos de manifestação… 17 O prodigioso corpo do homem na Crosta Terrestre foi erigido pacientemente no curso dos séculos, e o delicado veículo do Espírito, nos Planos mais elevados, vem sendo construído, célula a célula, na esteira dos milênios incessantes…

18 E, com um olhar significativo, Clarêncio concluiu:

— … Até que nos transfiramos de residência, aptos a deixar, em definitivo, o caminho das formas, colocando-nos na direção das Esferas do Espírito Puro, onde nos aguardam os inconcebíveis, os inimagináveis recursos da suprema sublimação.


2. Calara-se o instrutor, mas o assunto era por demais importante para que eu me desinteressasse dele apressadamente.

2 Recordei os inúmeros casos de moléstias obscuras de meu trato pessoal e aduzi:

Decerto a Medicina escreveria gloriosos capítulos na Terra, sondando com mais segurança os problemas e as angústias da alma…

3 — Gravá-los-á mais tarde, — confirmou Clarêncio, seguro de si. — Um dia, o homem ensinará ao homem, consoante as instruções do Divino Médico, que a cura de todos os males reside nele próprio. A percentagem quase total das enfermidades humanas guarda origem no psiquismo.

4 Sorridente, acrescentou:

— Orgulho, vaidade, tirania, egoísmo, preguiça e crueldade são vícios da mente, gerando perturbações e doenças em seus instrumentos de expressão.

5 No objetivo de aprender, observei:

— É por isso que temos os vales purgatoriais, depois do túmulo… A morte não é redenção…

— Nunca foi, — esclareceu o Ministro, bondoso. — O pássaro doente não se retira da condição de enfermo, tão só porque se lhe arrebente a gaiola. 6 O inferno é uma criação de almas desequilibradas que se ajuntam, assim como o charco é uma coleção de núcleos lodacentos, que se congregam uns aos outros. 7 Quando de consciência inclinada para o bem ou para o mal perpetramos esse ou aquele delito no mundo, realmente podemos ferir ou prejudicar a alguém, mas, antes de tudo, ferimos e prejudicamos a nós mesmos. 8 Se eliminamos a existência do próximo, nossa vítima receberá dos outros tanta simpatia que, em breve, se restabelecerá, nas leis de equilíbrio que nos governam, vindo, muita vez, em nosso auxílio, muito antes que possamos recompor os fios dilacerados de nossa consciência. 9 Quando ofendemos a essa ou àquela criatura, lesamos primeiramente a nossa própria alma, de vez que rebaixamos a nossa dignidade de Espíritos eternos, retardando em nós sagradas oportunidades de crescimento.

10 — Sim, — concordei, — tenho visto aqui aflitivas paisagens de provação que me constrangem a meditar…

— A enfermidade, como desarmonia espiritual, — atalhou o instrutor, — sobrevive no perispírito. As moléstias conhecidas no mundo e outras que ainda escapam ao diagnóstico humano, por muito tempo persistirão nas Esferas torturadas da alma, conduzindo-nos ao reajuste. 11 A dor é o grande e abençoado remédio. Reeduca-nos a atividade mental, reestruturando as peças de nossa instrumentação e polindo os fulcros anímicos de que se vale a nossa inteligência para desenvolver-se na jornada para a vida eterna. Depois do poder de Deus, é a única força capaz de alterar o rumo de nossos pensamentos, compelindo-nos a indispensáveis modificações, com vistas ao Plano Divino, a nosso respeito, e de cuja execução não poderemos fugir sem graves prejuízos para nós mesmos.

12 Nosso domicílio, porém, estava agora à vista.

Os raios dourados da manhã varriam o horizonte longínquo.

Despediu-se o Ministro, paternal.

Aquele era um dos momentos em que, desde muito, se devotava ele à oração.


André Luiz


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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