O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Coração e vida — Maria Dolores


13


História de uma festa

  1 O palacete brilha. A agitação é imensa.

  Lâmpadas recordando opalas e rubis

  São postas no jardim para serem acesas,

  Orquídeas multiplicam-se nas mesas,

  É o natalício em luz da pequena Beatriz.


  2 Ela, o centro da festa, a bela pequenina,

  Naquele casarão feito em linhas austeras,

  Completava oito lindas primaveras.

  Para todos aqueles que a cercavam,

  Era sempre gentil, generosa e suave,

  Um encanto de menina.


  3 O dia terminava, ante o sol inda quente,

  Entretanto, Beatriz,

  Muito embora gripada,

  Sentia-se feliz

  Na ideia de abraçar a muita gente…

  A única filha do casal Garcia

  Parecia voar num sonho de alegria.


  4 De minuto a minuto, estava à porta grande,

  Fitava a rua, em vão, para todos os lados

  E perguntava-se, ansiosa,

  De onde estariam vindo os convidados.


  5 Quase que de improviso,

  Ela enxerga Marcela, armada de sacola,

  A menina descalça e maltrapilha,

  Que, às vezes, passa ali pedindo esmola

  Para ajudar ao pai paralítico e só;

  Beatriz sente dó

  Da pequena vestida em trapos remendados

  E, abraçando-a, anuncia:

  — Vem comigo, Marcela, hoje é meu dia,

  Quero que comas do meu bolo.

  Mas, ao apresentá-la

  À senhora Garcia,

  Que parece manter-se de vigia,

  Nos adornos da sala,

  A filhinha acrescenta:

  — Mamãe, esta é Marcela,

  Que sempre vai ao nosso educandário,

  Tem o papai doente e espera o nosso auxílio,

  Peço à senhora dar a ela

  Um pedaço do bolo

  De meu aniversário.


  6 A menina, porém, escuta em desconsolo,

  A mãezinha dizer, séria e zangada:

  — Por onde foi você

  Buscar esta garota esfarrapada?

  Nossa festa é de amigos,

  Nossa casa não tem ligação com mendigos.

  E fitando Marcela, a dama continua:

  — Saia agora daqui, seu lugar é na rua…


  7 A menina em andrajos sai correndo,

  Mas Beatriz parada,

  Sob choque tremendo,

  Chora desconsolada…

  — Filha, por que você conserva essa mania,

  — Diz com severidade a senhora Garcia

  De dar tanta atenção a crianças imundas?

  Não mais me traga aqui pequenas vagabundas.


  8 Pouco tempo depois, a festa começava…

  Ante o bolo enfeitado e oito velas pequenas,

  Vozes erguiam felicitações,

  Irmanavam-se os votos e as canções,

  E num painel de rosas e açucenas,

  Uma orquestra vibrava…


  9 Terminada, porém, a festa linda,

  A família Garcia enfrenta o inesperado;

  Nove horas da noite… Cedo ainda…

  A pequena Beatriz havia piorado.

  Tinha a cabeça em fogo, o corpo em febre alta…

  O médico é chamado, investiga, examina

  E conclui pela voz da medicina:

  — Infelizmente, é o crupe… um monstro fulminante…

  Vem a medicação. De instante para instante,

  A doente piora, agita-se, delira

  E pergunta à mamãe: — Quem chama e se retira?

  Ah! mamãe, eu já sei quem expulsou Marcela,

  Quero dar de meu bolo um pedacinho a ela..

  Por que tenho, mamãe,

  Tanta roupa guardada,

  E Marcela anda assim esfarrapada?

  Por que Deus não quis dar a ela, o que me deu?


  10 A mãezinha, chorando, nada respondeu.

  Mas Beatriz prossegue: — eu quero ver Marcela!…


  11 Servidores da casa postos à procura

  De favela em favela,

  Não acharam sinal da pequena criatura…


  12 Finda a noite, ao clarão do amanhecer,

  Depois de rápida agonia,

  Mal começava o novo dia,

  A querida Beatriz, dantes contente e forte,

  Desfaleceu, por fim, ante os braços da morte…


  13 Ao ver a filha morta, a senhora Garcia

  Gritou a soluçar:

  — Deus de Imensa Bondade,

  Eu sei que o teu amor me ampara e me perdoa…

  Clamando a própria dor, em desespero enorme,

  Vendo a filha na calma de quem dorme,

  Rogou-lhe a pobre mãe, a desfazer-se em pranto:

  — Filha de minha vida, meu encanto,

  Não te afastes de mim que te amo tanto…

  Eu quero ser humilde, ensina-me a ser boa

  Não me deixes no mal, volve do Mais Além,

  Guia a mim, tua mãe, na prática do bem!…


  14 Mas a meiga Beatriz, agora sem mais dor

  E sem dizer mais nada,

  Que pudesse afastar o pesado amargor

  Da mãezinha cansada,

  Estampou sobre a face um sorriso de amor.


Maria Dolores


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