O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Instruções práticas.

(Idioma francês)

Capítulo VI.


PAPEL E INFLUÊNCIA DO MÉDIUM NAS MANIFESTAÇÕES.

Para compreender o papel do médium nas manifestações, é preciso dar-se conta da maneira por que se opera a transmissão do pensamento dos Espíritos. Falamos aqui dos médiuns escreventes.

Como já dissemos, o Espírito tem um envoltório semimaterial, que chamamos perispírito. O fluido condensado, por assim dizer, em redor do Espírito, para formar esse invólucro, é o intermediário pelo qual ele atua sobre os corpos; é o agente de seu poder material e é através dele que produz os fenômenos físicos.

Se examinarmos certos efeitos que se produzem nos movimentos da mesa, da cesta ou da prancheta que escreve, não há por que duvidar de uma ação exercida diretamente pelo Espírito sobre esses objetos. A cesta se agita às vezes com tanta violência que escapa das mãos do médium; algumas vezes ela se dirige para certas pessoas do círculo, a fim de nelas bater; outras vezes seus movimentos revelam um sentimento afetuoso. Dá-se a mesma coisa quando o lápis é colocado na mão; muitas vezes é lançado ao longe com força, ou então a mão, como a cesta, se agita convulsivamente e bate na mesa com cólera, ainda mesmo que o médium se conserve perfeitamente tranquilo, admirando-se de não ser mais senhor de si. Digamos, de passagem, que esses efeitos denotam geralmente a presença de Espíritos imperfeitos. Os Espíritos realmente superiores são invariavelmente calmos, dignos e benevolentes; se não são ouvidos convenientemente, retiram-se e outros lhes tomam o lugar. O Espírito pode, pois, exprimir diretamente o seu pensamento pelo movimento de um objeto, não passando a mão do médium senão de um ponto de apoio; ele pode fazê-lo mesmo sem que esse objeto esteja em contato com o médium.

A transmissão do pensamento também se dá por intermédio do Espírito do médium, ou melhor, de sua alma, visto que designamos por este nome o Espírito encarnado. Nesse caso, o Espírito estranho não atua sobre a mão para fazê-la escrever, como não atua sobre a cesta; ele não a segura, nem a guia. Atua sobre a alma com a qual se identifica. A alma, sob este impulso, dirige a mão por meio do fluido que compõe seu próprio perispírito; a mão dirige a cesta e esta dirige o lápis. Notemos, aqui — e isto é importante saber — que o Espírito estranho não se substitui à alma, pois não pode desalojá-la: ele a domina a revelia dela e lhe imprime sua vontade. Quando dizemos à revelia dela, queremos falar da alma atuando exteriormente pelos órgãos do corpo; mas a alma, na condição de Espírito, mesmo encarnado, pode perfeitamente ter consciência da ação exercida sobre ela por um Espírito estranho. Nessa circunstância, o papel da alma é, algumas vezes, inteiramente passivo e então o médium, se é falante, não tem nenhuma consciência do que escreve ou diz. Mas pode ocorrer que a passividade não seja absoluta; então ele tem uma consciência mais ou menos vaga, embora sua mão seja arrastada por um movimento maquinal, ao qual a vontade permanece alheia.

Se for assim, dirão, nada prova que seja um Espírito estranho que escreve e não o médium. Aqui é o lugar de rebater um erro partilhado por algumas pessoas. Diremos, pois, que pode acontecer que a alma do médium se comunique como o faria um Espírito estranho, o que se concebe facilmente. Já que podemos evocar o Espírito de pessoas vivas, ausentes ou presentes, e como esse Espírito se comunica pela escrita ou pela palavra do médium, por que o Espírito encarnado no medianeiro não se comunicaria igualmente? Os fatos provam que, em certas circunstâncias, isto ocorre, como no sonambulismo, por exemplo. Segue-se daí que a comunicação dada pela alma do médium tenha menos valor? Absolutamente. O Espírito encarnado no médium pode ser mais elevado do que certos Espíritos estranhos e, assim, dar melhores comunicações; cabe-nos julgar. Neste caso ele fala como Espírito desprendido da matéria, e não como homem. A questão é saber se não é sempre o Espírito do médium que emite seus próprios pensamentos, como alguns pretendem. Esta opinião absoluta é um sistema que só pode ter sua origem numa observação incompleta. Por isso é sempre perigoso conceber teorias sobre coisas que não analisamos com a devida profundidade ou das quais só pudemos ver uma face.

Sem dúvida, há casos em que a intervenção de um Espírito estranho não é incontestável; mas basta que em alguns ela seja manifesta para concluir-se que outro Espírito, que não seja o do médium, pode comunicar-se. Ora, essa intervenção estranha não pode ser duvidosa nos seguintes exemplos: quando uma pessoa, embora não sabendo ler nem escrever, escreve como médium; quando um médium fala ou escreve numa língua que não conhece; quando, enfim, o que é o caso mais comum, ele não tem consciência alguma do que escreve, e os pensamentos que exprime são contrários ao seu modo de ver, estão fora de seus conhecimentos ou do alcance de sua inteligência. Sobre este último fato a experiência dá provas tão numerosas e palpáveis, que não é permitida a dúvida a quem quer que tenha observado muito e, sobretudo, observado bem.

Seja qual for, pois, o modo de ação do Espírito estranho para a produção da escrita ou para expressão do pensamento pela palavra, o médium nunca passa de um instrumento mais ou menos cômodo. Isto nos enseja fazer uma observação importante, que responderá a esta pergunta natural: por que nem todos os médiuns escrevem em todas as línguas que lhes são desconhecidas?

Sem dúvida o Espírito estranho compreende todas as línguas, pois as línguas são a expressão do pensamento e o Espírito compreende pelo pensamento. Mas, para transmitir esse pensamento, é preciso um instrumento: esse instrumento é o médium. A alma do médium, que recebe a comunicação estranha, não pode transmiti-la senão pelos órgãos de seu corpo. Ora, esses órgãos não podem ter, para uma língua desconhecida, a flexibilidade que têm para a que lhes é familiar. Um médium que sabe apenas o francês, poderá acidentalmente dar uma resposta em inglês, por exemplo, se apraz ao Espírito fazê-lo; mas os Espíritos, que já acham a língua humana demasiado lenta, tendo em vista a rapidez do pensamento, a ponto de abreviarem o quanto podem, impacientam-se com a resistência mecânica que experimentam. Eis por que eles nem sempre o fazem.

E esta também a razão pela qual um médium principiante, que escreve penosamente e com lentidão, mesmo em sua própria língua, geralmente só obtém respostas breves e superficiais. É por isso que os Espíritos recomendam que não se faça, por intermédio deles, senão perguntas simples. Para as de alto alcance, é preciso um médium desenvolvido, que não ofereça nenhuma dificuldade mecânica ao Espírito. Não tomaríamos, para nosso leitor, um menino de escola que apenas soletra. Um bom operário não gosta de servir-se de más ferramentas.

Acrescentemos outra consideração bastante grave no que concerne às línguas estrangeiras. Os ensaios desse gênero são sempre feitos com um fito de curiosidade e de experimentação. Ora, nada é mais antipático aos Espíritos do que as provas às quais tentamos submetê-los. Os Espíritos Superiores jamais se prestam a isto e se retiram tão logo enveredamos por esse caminho. Tanto se comprazem nas coisas úteis e sérias, quanto sentem repugnância em ocupar-se de coisas fúteis e sem objetivo. Os incrédulos, contudo, dirão que esse objetivo é útil para convencer, já que podem angariar adeptos para a causa dos Espíritos. A isso os Espíritos respondem: “Nossa causa não necessita daqueles que são bastante orgulhosos para se julgarem indispensáveis. Chamamos a nós aqueles que queremos, e muitas vezes são os menores e os mais humildes. Jesus operou os milagres que os escribas lhe pediam? E de que homens se serviu para revolucionar o mundo? Se quereis vos convencer, tendes outros meios que não a prestidigitação. Começai primeiro por submeter-vos: não faz parte da norma que o aluno imponha sua vontade ao mestre”.

Resulta daí, salvo raras exceções, que o médium transmite o pensamento dos Espíritos pelos meios mecânicos que estão à sua disposição, e que a expressão desse pensamento pode, e deve mesmo, no mais das vezes, ressentir-se da imperfeição desses meios. Assim, o homem inculto, o camponês, poderá dizer as coisas mais belas, exprimir os pensamentos mais elevados, mais filosóficos, falando como um camponês. Para os Espíritos o pensamento é tudo, a forma nada é. Isto responde à objeção de certos críticos a respeito das incorreções de estilo e de ortografia que se lhes podem censurar e que podem provir tanto do médium quanto do Espírito. É uma futilidade agarrar-se a semelhantes coisas.

Se o médium, do ponto de vista da execução, não passa de um instrumento, ele exerce, sob outro ponto de vista, uma influência muito grande. Visto que, para se comunicar, o Espírito estranho se identifica com o do médium, essa identificação só pode ocorrer quando há simpatia e, vale dizer, afinidade entre eles. A alma exerce sobre o Espírito estranho uma espécie de atração ou de repulsão, segundo o grau de sua similitude ou dissemelhança. Ora, os bons têm afinidade pelos bons e os maus pelos maus, donde se segue que as qualidades morais do médium têm uma influência capital sobre a natureza dos Espíritos que se comunicam por seu intermédio. Se ele é vicioso, os Espíritos inferiores vêm agrupar-se em torno dele e estão sempre prontos para tomar o lugar dos bons Espíritos que foram chamados.

As qualidades que atraem os bons Espíritos são: a bondade, a benevolência, a simplicidade de coração, o amor ao próximo e o desprendimento das coisas materiais. Os defeitos que os repelem são: o egoísmo, a inveja, o ciúme, o ódio, a cupidez, a sensualidade e todas as paixões pelas quais o homem se prende à matéria. Um médium por excelência seria, pois, aquele que, à facilidade de execução, aliasse no mais alto grau as qualidades morais.

A influência do Espírito do médium pode ainda exercer-se de outra maneira. Se for hostil ao Espírito estranho que se comunica, poderá não interpretar fielmente o pensamento deste, alterar ou falsear suas ideias ou transmiti-las em termos impróprios. Dá-se o mesmo entre nós quando confiamos a um homem de má-fé uma missão de confiança.

A faculdade mediúnica, seja qual for o seu grau de desenvolvimento, não basta, pois, para garantir boas comunicações. Antes de tudo e como condição expressa, é necessário um médium simpático aos bons Espíritos. A repulsa destes para com os médiuns inferiores, do ponto de vista moral, compreende-se facilmente. Tomamos para confidentes de nossos pensamentos criaturas que não estimamos?

Certas pessoas são realmente mal favorecidas no que se refere às comunicações. Existem aquelas que não recebem ou não transmitem, habitualmente, senão trivialidades ou grosserias, para dizer o mínimo. Elas devem deplorar este fato como um indício certo da natureza dos Espíritos que se agrupam em redor delas, porquanto, certamente, não são Espíritos Superiores que usam semelhante linguagem. Devem, pois, envidar todos os esforços possíveis para se desembaraçarem de acólitos tão pouco recomendáveis, a menos que se deleitem nestas espécies de conversações. Nós as aconselhamos, em todos os casos, a evitarem fazer alarde desse fato, pois isto poderia dar uma ideia pouco lisonjeira das simpatias que encontram no mundo dos Espíritos. Completaremos o que temos a dizer sobre os médiuns à medida que o exigir a sequência de nossas instruções.

Então, é absolutamente impossível obter boas comunicações através de médiuns imperfeitos? É o que veremos no capítulo seguinte.


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